quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Wilder F. Santana

Nascer não é estar entre dementes!

A terra que piso é conhecida. É o orvalho de mim! Descalço, lançando-se em feridas e orgulhos translineadores. Meu quintal, ah, quintal em que maravilhas e... casos foram feitos. Refinado e agressivo? Alguns classificam o passado como início do presente. Eu o considero simplesmente nuvem!

Quantas vezes a culpa do nada me perseguia! Sei – ou tento saber, que a consciência é uma neve sórdida, ao menos na capacidade de ser alva e repetente em seu ego. Libertação? Gosto dessa palavra, é uma pena que, por muitos anos tenha sido tratada como uma prisioneira!

Já dizia Shakespeare: “Choramos ao nascer porque chegamos a este imenso cenário de dementes.” Ora, mas o que é uma lágrima? Que sentido tem o nascimento? Pura descrença crer que lágrimas são motivos de insuficiência! Ou a demência é um enfraquecimento mental, cujas forças intelectuais nos fogem, estando nós ausentes de sendo crítico? Não, não choramos ao nascer porque chegamos até aqui onde “existem dementes”. Mas sabemos que a tarefa futura será árdua, o choro é a admissão de virtude, dor e talento juntos. Muito pelo contrário, a humanidade tem o dom da inteligência, são seres animados para a progressão!

Concordei com o retrato da sala de vovó: ela poderia me esquecer. Não por não gostar de mim, mas meu retrato se instalara em seu ambiente de conforto para que a cada dia surja um novo pensamento. A vida não para, meus caros! Somos carroça e pão! Muito mais sujos estamos por estas veias espirituais do que por uma mão não lavada...

Jamais a consciência faz de nós pesados, mas nós criamos um caminho pelo qual ela é capaz de nos crucificar. Opor coisas é um estímulo! Se tivemos o poder, um dia, de criar a destruição, podemos destruí-la! Muito mais fortes são os que têm capacidade de perdoar. Erros ou fracassos jamais são esquecidos, mas podem ser substituídos por conquistas. Eis o poder do “amor-mente”!

Com isso viajo novamente ao meu quintal e vejo a calçada (antes eram árvores...). Um balanço de subidas, descidas e quedas. Tento ser a moeda de três lados, o terceiro é o lado do amor. Os seres humanos não vivem entre seus cuspes, infelizmente ainda estamos aceitando o que a inveja pode criar. O tanque de água de vovó. Os soluços que muitas vezes tive, e ela dizia: “meu filho, beba água e fique de cabeça para baixo que passa...”

Enfim, o grito mórbido de ignorância! Ainda sou inóspito quanto ao nascer. Possuo a gota de uma caneta que brilha e borra. Rascunho que salva? Não, infelizmente ainda não há relatos de que a matéria bruta nos transmuta da morte para os ventos. Nem de que os ventos são capazes de ressuscitar.

Cada vez em que me prendo ao “não chorar”, destruo-me. Dou-me em um pequeno e vago navio de papel. Não sou o príncipe que um dia virou sapo, nem o sapatinho de cristal perdido, esperando pelo pé ideal. Sou a escolha viva de perpetuar no nascimento Deus.

A preciosidade do amor humano

A vida perpassa por onde os olhos não veem, eles se doam. As flores são as damas da magnificência. Elas controlam os tormentos humanos e ramificam dores com seu cerne. Já dizia nossa querida Clarice Lispector: “Um olho vigiava a minha vida. A esse olho eu chamava de verdade, ora de moral, ora de lei humana, ora de Deus, ora de mim”. E é verdade. Somos a consciência viva, mas perpetuamos em pequenas soluções. A visão que não se enxerga é a essência do inabitado.

Ora, tenhamos a capacidade de dar bom dia, agradecer pelas diversas acontecências que nos rodeiam. O homem liberta-se do seu caos quando a sombria névoa de ilusões desmancha-se em cicatrizes. Cicatriz é a nossa constante restauração; a pauta humana não é dotada apenas de vitórias. Grandes feridas existem e nos fazem sofrer, mas precisamos contorná-las no invólucro do amor. O que somos? Por que estamos aqui? O que fazemos, além de acontecer instantaneamente?

A educação é o dom das boas maneiras, é a nossa capacidade, não só de nos organizarmos, mas de aprendermos a respeitar uns aos outros. “Um passo é a chance de se encontrar”. Através de um passo, grandes universos podem surgir, grandes ausências podem ganhar vida. Basta crermos. Basta pularmos da ponte que nos liga à razão, e cairmos no lago dos sentimentos. Um passo é a suficiência, basta termos força para superar as barreiras. Atitudes não são apenas demonstrações, mas a virtude de dar continuidade à existência.

A prova concreta de que a amizade é o fruto da resolução fraterna é que não conseguimos habitar na solidão. O confinamento faz crer que as derrotas têm poder sobre nós, mas não nos esqueçamos de que a vela perene do mundo é a lágrima do amadurecimento. Chorar não é sofrer, é exortar a dor que se sente no mais puro modo do derretimento. A síncrese da modificação é a ousadia da compaixão.

Quando os maus momentos nos afligem, podemos substituí-los. O resgate de uma vida versa a própria ação da libertação. A perda não deve significar apenas transtornos, pois é no íntimo da desilusão que podemos refletir sobre o que nos fez perecer. A vida, então com o olho agudo do ressentimento. Alimentar-se na ressurreição de antigos amores.

O pó que invalida o mundo é o desterro prisioneiro e brutal da discórdia? Sim, porém a gema da esperança é o mais singelo sorriso que acende no rosto de quem ama. No útero a grande ideia da condicionalidade. Pensamos e agimos conforme seja a argúcia. O latente prazer humano é a arte silenciosa de permanentes pesadelos.

Sonhar é se ter, é se amar. Viver é mais que um sonho. É, enfim, a gota de água que alimenta os segredos dos olhos que nos vigiam. Que despertem incisivas e excitantes as aves que dormem caladas em nossos ombros...

Wilder F. Santana


A natureza dos descobrimentos


A natureza verdadeiramente nos completa, é o constante equilíbrio entre pensamentos e instintos. O que é belo vem de dentro, ou seja, a apreciação daquilo que criamos se manifesta do interno para o externo, evidenciando seu brilhantismo.

Lembro, com relação às pedras da vida, de uma poesia de minha autoria, que diz: “As mãos não apenas acariciam, também são mãos que ferem; mãos do mundo!” Por vezes lembro que fomos feridos e rejeitados, mas a consciência de um amanhã mais reverberado nos faz alcançar a vidraça magnânima. O mito da caverna remete consciência, lucidez, cerne!

“Oh, o eterno desprezo da palavra verdade, a ganância do pecado sobre ferrugens e corpos desnudos...” Ultimamente estive mais observante para com as infinitudes da vida, e percebi o quanto as palavras nos dignificam. Infinitos, muitas vezes, são cárceres!

Libras e fibras do verde da alma (talvez cor de esperança) espelhamse na impaciência de afetos gélidos. Quem sabe amar seja estar dentro da ausência? Pode ser que um largo centro contenha danos de cada profundeza. Até imagens de um filme de terror foram vistas, antes que vidros pulassem secos, sem o sabor das imagens frutíferas...!

Atrevi-me, ontem pela manhã a conversar com algumas flores e me surpreendi com tamanha decência. Elas próprias têm toda a capacidade de formar enxágües em seu universo num só recipiente: a delicadeza do amor. Disseram–me coisas belas, inclusive relataram que o sol só nasce claro entre o amanhecer e o véu de humildade que desce dos céus.

Aprendi que é impossível se achar por muito tempo na infelicidade, porque ela é um artifício passivo. Dentre os amplos horizontes os quais sobrevoei, vi no fundo de um antro um feixe de luz. A luz era sóbria e bem–aventurada. Dava–me a ousadia de sair do assombro das partidas. A luz da amizade com certeza só não é mais contagiante do que o a do amor porque, em essência, já é gerada por ele. O sol em gozo nos ramifica, e assim formamos a árvore dos bons devaneios.

Mais uma vez as superações são capazes de dar aparição a seres vagantes. Enquanto muitos vivem libertos – entre lençóis manchados e pernas erguidas –, outros são torturados dentro de seu êxtase de compaixão.

Um dia que se passa, e eu a lembrar os melhores momentos da vida. Horas frágeis em que escrevia, lembranças de um tempo que jamais existiu! (A mudança provoca rupturas). Recordo da família, dos amigos, de como me entorpeci em alegrias. Os segredos revelados, músicas emudecidas, silêncios em severo despir. Mais um dia se aguenta nesse mundo passageiro, e eu consolome na dor de ser areia. A refletir sobre línguas e anseios. Saliva e puro sangue: eu e o meu poetar.